Sexto dia, 11 de abril de 2013. Impresões de Zampa, relatadas em maio.
Saímos cedo de São José do Xingu, rumo a Cotriguaçu, via Matupá e
Alta Floresta. Não chegamos, entretanto ao destino planejado. Como relatou o
Lucas, cerca de 80 km à frente entramos em território indígena do Xingu
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Parque_Ind%C3%ADgena_do_Xingu). Uma corda mambembe, da cor da lama, próxima ao chão, sem nenhuma placa
indicativa nela ou nos arredores e nenhuma pessoa à vista, acabou por fazer que
nosso amigo Newton não a visse. Isso foi suficiente para que um indígena com
colete de “autoridade” aparecesse para dizer que havia sido um desrespeito o
rompimento da corda e pelo ato cobrou módicos R$10,00. Lucas, o fotógrafo
improvisado e oficial de nossa Expedição, de dentro da XTerra, tirava fotos das
casas á beira da estrada, enquanto pagávamos a corda e os R$70,00 pela
travessia da balsa do Rio Xingu (a 2ª da viagem).
A tal autoridade, mais uma vez, veio irritada
dizer que as fotos eram proibidas e que ele poderia apreender a máquina. Tive
que argumentar com o “chefe” que ele deveria
nos indicar qual lei vedava fotos na área e onde estava a placa que informava tal proibição. Desconversou.
Seguimos alguns
quilômetros para descobrir que a estrada – uma mera faixa de terra, quase
cortada pelo mundo de água que a rodeava - estava interrompida por uma carreta.
Várias outras carretas, picapes e até mesmo veículos pequenos esperavam, sem
nenhuma perspectiva de passar.
Depois de avaliar a profundidade
da água e lama que cobria as bordas da estrada decidimos arriscar e, com alguma
adrenalina, conseguimos passar. O risco não era tanto atolar, mas derrapar, quer
para fora da estrada, e cair no mundo de água, quer ir contra a carroceria da
carreta, o que deixaria algum estrago em nossas viaturas. Vista, pelas fotos, a
situação parece mais tranqüila. Mas eu havia medido a “aguinha” à esquerda e
sabia que não podíamos cair ali pois a estrada era levantada em relação ao
terreno. Derrapar para a esquerda era cair
na água mal escondida sob os arbustos.
Passamos, mas nosso espírito Off Road veio à tona e decidimos arrastar a carreta. Estreamos as novas cintas e, atreladas às duas viaturas, engatamos a reduzida e pisamos no acelerador.
Com alguma dificuldade e como uma lesma preguiçosa a carreta foi se movendo e finalmente a levamos para a área de terreno firme. Alguns dos presentes ajudaram na operação. Uns ficaram com dó de colocar na lama cintas tão branquinhas…e a seguravam levantada até que estivessem tensionadas.
Passamos, mas nosso espírito Off Road veio à tona e decidimos arrastar a carreta. Estreamos as novas cintas e, atreladas às duas viaturas, engatamos a reduzida e pisamos no acelerador.
Com alguma dificuldade e como uma lesma preguiçosa a carreta foi se movendo e finalmente a levamos para a área de terreno firme. Alguns dos presentes ajudaram na operação. Uns ficaram com dó de colocar na lama cintas tão branquinhas…e a seguravam levantada até que estivessem tensionadas.
Lucas fotografava toda a operação
quando, mais uma vez, veio a tal “autoridade” implicar com as fotos. Parou.
Razão pela qual não temos fotos da carreta sendo arrastada. Diziam os demais
presentes que, sem avisar nada, “os índios” cobravam R$ 20,00 por cada foto do
rio tirada durante a travessia. Independentemente da espoliação histórica pela
qual passou e passa a população indígena brasileira, cobrar pelas fotos se trata de pura
extorsão. Essa atitude, nas opiniões dos presentes - contribui para aprofundar o
preconceito contra os “índios” em geral. Argumentei com alguns, dizendo
que, em passado recente, já cruzara
outros territórios indígenas e que, em tais ocasiões, os "índios" foram bem acolhedores e simpáticos. Portanto, não devíamos e não devemos generalizar: entre os
“índios”, como entre os “brancos”, há gente de toda índole.
Tendo arrastado a carreta que
dificultava a passagem dos menos corajosos – mesmo com picapes – outros passaram.
Para chegar à boca da balsa foi preciso cruzar uns 100m de água (0,50 cm) do
rio que cortava a estrada. Esperamos que o operador da balsa, um membro da
comunidade indígena viesse pilotá-la, o que fez com a maestria esperada.
Contemplar a imensidão das águas onipresentes, e agora ao
relatar, veio-me à tona um tema que já deveria ter comentado: nosso parceiro, Newton,
homem que mora em Jacobina, parte do sertão baiano assolado por terrível seca,
não se cansava de expressar sua euforia diante da abundância de água, capim
verde e gado gordo que tomava conta da paisagem desde a entrada no Tocantins. Diante do imenso
rio Xingu, que alagava quilômetros e quilômetros de matas às suas margens, foi
inevitável relembrar de Canudos e Antônio Conselheiro, de Vidas Secas, de O Quinze
e da tristeza que me abate quando circulo pelo sertão esturricado pelo sol.
Cheguei a pensar que o paraíso sonhado por um sertanejo nordestino se
assemelharia àquelas paisagens com água brotando nas margens das estradas,
capim verde e alto, gado gordo. O sertão virar mar, de água doce! Doce sonho,
vã esperança.
Água na terra, água no céu.
Água na terra, água no céu.
Passada a balsa, os devaneios se
esvaíram. Pé na estrada! Tínhamos percorrido pequena distância e muita lama
ainda nos separava do destino do dia: Alta Floresta. Mal saímos da balsa e uma forte chuva
anunciava bons momentos. A estrada, cercada de bela mata de transição entre o
bioma do Cerrado e da Floresta Amazônica, tinha realmente muita lama, grandes
poças de água e alguns bons atoleiros.
Foi diante de um desses que Newton
decidiu não esperar um caminhão passar –
carregado de sucata de ferro que levava para Marabá! – e resolveu se
arriscar pela lateral da estrada, fora da trilha batida. Não deu outra: atolou
feio! Newton resolveu estreiar as botas de borracha e como num balé, tentava se equlibrar na estreita faixa de terreno firme...
Era nossa chance de usar pela primeira vez os guinchos e nos lambuzarmos de lama, mas eis
que a solidariedade estradeira falou alto e o caminhoneiro deu uma ré e depois
de expressar seu espanto pela atitude do Newton, ("Eu olhei e pensei: ele não é doido de entrar ali! Pois não é que entrou?", disse ele) rapidamente arranjou uma corda
e aos pouco arrastou a Savana para trás, para terreno firme. Newton estava
ficando animado. Lama não faltava, mas ainda não era suficiente para ele poder
estrear os pneus tratorados que comprara especialmente para a expedição. Na
borda da estrada uma anta deixara as marcas de suas patas “tratoradas” na noite
anterior.
Algumas dezenas de quilômetros
adiante, chegamos, já pelas 14hs, a uma casa/restaurante. Perdidos no meio do
nada, sem vizinhos senão a dezenas de quilômetros, o casal já na faixa de seus
60 anos ali vive e mantém o “Restaurante JD (iniciais de ambos) - comida
caseira feita na hora”.
De fato: num fogão à lenha, as panelas quentes
guardavam os segredos e os aromas de deliciosa comida caseira. Carnes de
frango, porco e vaca, aipim, abóbora, feijão, arroz. Tudo convidava nosso
estômago e olhos famintos. Comemos a nos fartar. Um gerador a diesel, ligado
algumas poucas horas do dia e da noite, mantém o casal distraído com as novelas
e telejornais – ambas parecem ficção vinda de um mundo distante e irreal – e as
cervejas e refrigerantes frescos.
A estrada parecia uma reta sem
fim, levando-nos ao infinito. Um risco marrom num papel verde. Uma serpente
esticada. Mas a serpente real que encontramos era uma jovem jibóia, certamente
migrando em busca de acasalamento.
Para evitar que fosse perversamente atropelada por outro veículo – vivo é o preconceito geral contra as cobras – tratei de ajudá-la (não sem protestos por parte dela) a atravessar rapidamente a estrada. Lucas mal tirou umas fotos e rapidamente se refugiou na XTerra. Não era medo, dizia ele, era respeito. Tá bom!
Para evitar que fosse perversamente atropelada por outro veículo – vivo é o preconceito geral contra as cobras – tratei de ajudá-la (não sem protestos por parte dela) a atravessar rapidamente a estrada. Lucas mal tirou umas fotos e rapidamente se refugiou na XTerra. Não era medo, dizia ele, era respeito. Tá bom!
Seguimos adiante e era o contínuo
e infindável cruzar de rios com pontes – em geral simples troncos. A estrada
era ladeada por capim, bois, alguma mata, buritizais infindos e majestosas
castanheiras, em tese, protegidas do abate. Passamos dois pequenos povoados, um
sem nome visível, com estabelecimentos que não escondiam a sua vocação, como o
Bataclãn Bar – sim, com til e ene -, outro orgulhosamente informava: “Novo Mundo” e para dar credibilidade, a
placa dizia sob o nome: “de Verdade”.
Eram já 17:00hs e nosso destino ainda
estava a 114km. Afundamos o pé na medida do possível. Nuvens escuras, prenhes, tornavam o entardecer cinza e pesado mas, ao
cruzamos a balsa (3ª) do enorme e
piscoso Teles Pires, o tempo sorriu e os últimos raios do sol banharam as
águas, parecendo noite de luar.
Rio Teles Pires
Depois de um dia que começara as
06:50hs e rodado 412 km em 12 horas, havíamos
cruzado por balsa, dois rios, passado por águas de rios e igarapés que cortavam a
estrada, desatolado carreta; chegamos às 19:00 hs em Carlinda e, exaustos,
decidimos ali ficar. Escolha acertada. Procuramos um hotel. Uma menina de uns
07 anos tomava conta daquilo que era casa e hotel. Daí a pouco chegou
esbaforida a mãe e dona do negócio, que se explicou: ela estava apoiando o
marido na “inauguração” de um carrinho de espetinhos na brasa, ao lado de um
quiosque na principal avenida da cidade. Nos convidou para prestigiar o evento
e lá fomos nós. Tomamos umas cervejas “Cristal” e experimentamos o tal espetinho.
Ambos bons. A jovem atendente do quiosque, loiríssima, certamente sulista, como
a imensa maioria dos moradores, era toda sorrisos. Flertes de beira de
estrada... O namorado, disse ela, estava rondando para fazer a guarda... Pobre
homem! Como se isso fosse possível... Mas, dela só guardamos os sorrisos.
manda o numero de vcs
ResponderExcluir